Aldeia Fulni-ô se sustenta com venda de produtos típicos, com crise na saúde, fonte de renda minguou
O povo indígena da etnia Fulni-ô tomou uma difícil decisão há algumas décadas: comercializar a arte, os produtos medicinais e abrir a aldeia para os brancos. O motivo para isso foi a seca que tornou impossível que a aldeia sobrevivesse apenas com a caça, pesca e plantio. Ironicamente, Fulni-ô significa à beira do rio e está localizado em Águas Belas, interior de Pernambuco. Mas a comunidade, com mais de seis mil indígenas, fica no Polígono da Seca.
Há cerca de 20 anos, eles começaram a percorrer o Brasil com artesanato e medicamentos indígenas, além de realizarem alguns trabalhos espirituais. Porém, em 2020 os Fulni-ô encontram-se com outro desafio: sobreviver à pandemia do Coronavírus.
Com as restrições sanitárias, eles tiveram que suspender as viagens e fecharam a entrada na aldeia. Além disso, perderam alguns membros Fulni-ô para a Covid-19. Dessa vez, o que secou foi a fonte de renda, o que complicou a manutenção da comunidade.
Toé, um dos membros Fulni-ô, afirma que é a solidariedade que tem contribuído com o sustento na aldeia. Doações têm chegado e algumas iniciativas, como vaquinhas on-line, têm sido realizadas com o objetivo de ajudar os indígenas a sobreviverem à crise.


Peregrina desenvolve projeto para fortalecer negócios e cultura de povos originários
Fundadora da Peregrina, Maruscka Grassano é parceira dos Fulni-ô e vendia parte do artesanato e produtos medicinais. Ela é nômade digital e tem uma loja no Instagram chamada Peregrina. O foco é a venda de produtos étnicos, há sete anos.
Com a chegada da Covid-19, ela também viu as possibilidades que tinha minguarem. A nômade, que garimpava os produtos mundo afora, precisou se isolar no home-office. Mas foi neste ambiente que surgiu uma ideia: ter uma plataforma on-line para fortalecer comunidades, inclusive as indígenas.
Para isso, ela aposta no que tem amenizado a crise na aldeia Fulni ô, a solidariedade. Deu certo, ela arrecadou cerca de R$4000,00 em uma campanha de financiamento coletivo na plataforma Benfeitoria para desenvolver um marketplace, um e-commerce para que artesãos, artistas e povos de todo mundo possam vender seus produtos sem saírem da comunidade.
“A ideia é que quem tenha condições custeie a presença de quem não possa pagar. É uma forma de conseguir mais clientes e de apoiar um negócio de impacto social. Mais do que um ambiente para comercialização de artesanato, roupas e outros, quero capacitar as comunidades para que elas consigam mais resultados com a venda de seus produtos.
Dessa forma, o valor também vai ajudar nos custos dessas formações. O objetivo não é usar a plataforma para escalonar o negócio, mas compartilhar possibilidades, trocas significativas, compras com propósito”, explicou Maruscka.



Mais do que simples produtos
Quem estiver no marketplace da Peregrina leva mais que produtos para casa. No caso de quem adquire um produto dos Fulni-ô, por exemplo, a pessoa terá amuletos de proteção.
De acordo com o indígena Toé, quando a aldeia decidiu levar o artesanato a outros povos, foi feito um trabalho espiritual para que pudessem sair da comunidade. O artesanato, a produção medicinal e outros são fruto de saberes ancestrais sagrados. Muita coisa, ele garante, ainda não pode sair da aldeia, mas tudo que chega aos não-indígenas é feito de forma muito especial.
“Quando você está com uma pulseira nossa ou um cocar, por exemplo, tem a proteção dos deuses da natureza”, explica.