Por Ella Barruzzi
Quando você desce do ônibus depois de longas horas ininterruptas sem urinar e avista o Lago Titicaca, a primeira coisa que pensa é “cadê o banheiro?”.
Titicaca acaba ficando em segundo plano quando o cheiro de trutas recém assadas invade suas narinas, enquanto procura por algum resquício de papel higiênico que não existe na Bolívia. A dúvida é se uma truta basta para duas pessoas ou duas trutas não bastarão nem para uma. Descobrir que seu tempo parou em um fuso horário não muito longe dali pode causar certo desespero, principalmente quando a última embarcação para Isla del Sol parte em 5 minutos, porém sua truta ainda não está devidamente “enmarmitada”.
Correr com uma mochila de 12 quilos nas costas não é uma das melhores sensações do mundo, principalmente quando umas 30 pessoas esperam apenas por você. Mas embarcar com uma marmita de truta e comer um peixe recém pescado, navegando pelo mesmo lago em que ele esteve pela última vez em vida, é extraordinário! A única coisa não perdoável é uma reserva no hostel mais distante, no alto da montanha – quase não – habitada.
Agora, o peso da mochila passou para 37 quilos – toneladas -, em uma caminhada de 1 hora e meia, onde os pulmões pararam de funcionar estando à 3.821 metros acima do nível do mar. Alguém se oferece para carregar seu peso, mas a carga de vida é sua. Apenas sua.
A contemplação está presente em cada curva, em cada degrau, em cada casinha de reboco por onde os olhos passam, quase em 360 graus. O lago aos meus pés não emite nenhum som, não há pios de aves, não existe barulho do vento, o frio é oco e cortante. Apenas escuto o pulsar do meu coração batendo forte no peito depois de entender que para estar aqui é preciso merecer. Merecer o Titicaca.